19/02/2016 às 13h25min - Atualizada em 19/02/2016 às 13h25min

Bactérias do Bem - Pesquisa investiga produção de bioativos por actinobactérias da Amazônia

Realizado no Laboratório de Microbiologia da Ufopa, o projeto possui vários estudos em andamento, com profissionais de diferentes áreas do conhecimento,

Por: Maria Lúcia Morais
Comunicação/Ufopa

Foto: Divulgação

SANTARÉM - Coordenado pela professora Katrine Escher, do Instituto de Saúde Coletiva (Isco) da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), o projeto de pesquisa "Diversidade de Actinobactérias em solos da Amazônia" investiga, desde 2012, a produção de compostos bioativos, substâncias benéficas de ampla utilização medicinal e industrial, por bactérias. O objetivo é o isolamento e a identificação de micro-organismos autóctones da Amazônia para a obtenção desses compostos. "As plantas têm propriedades medicinais. As bactérias também", afirma Katrine Escher.

Segundo a bióloga, as pesquisas para obtenção de bioativos de origem microbiana iniciaram-se na década de 1930, sendo as actinobactérias - um filo de bactérias Gram-positivas que ocorrem amplamente no solo, onde

desempenham relevante papel biológico - um dos grupos mais pesquisados. "São mais de 130 gêneros no grupo das Actinobactérias já identificados pela ciência", afirma. Um dos principais gêneros é o Streptomyces, responsável por cerca de 70% dos antibióticos fabricados hoje pela indústria farmacêutica.

A professora da Ufopa explica que as actinobactérias produzem uma infinidade de metabólitos bioativos (substâncias resultantes do metabolismo de uma determinada molécula) com propriedades terapêuticas - antiparasitárias, antitumorais, anti-inflamatórias, antivirais -, além de vitaminas e enzimas de interesse industrial e comercial. "O que me motiva é a busca por novas substâncias para produção de fármacos efetivos contra os micro-organismos multirresistentes", afirma Escher. "Já sabemos o potencial das actinobactérias para produção de bioativos, mas pouco sabemos da distribuição deste grupo de bactérias na Amazônia, que possui diferentes características de solos e vegetação, possivelmente produtoras de bioativos diferenciados".

Macacaporanga – Uma das pesquisas em andamento isolou actinobactérias dos gêneros Streptomyces sp., Streptomyces cinereus e Microbacterium xylanibyticum presentes no solo circundante à raiz de macacaporanga (Aniba parviflora Syn. A. Fragans), espécie vegetal nativa da Amazônia, estudada nos últimos anos pela capacidade de produzir componentes aromáticos semelhantes aos do pau-rosa (Aniba rosaeodora), espécie ameaçada de extinção utilizada pela indústria de perfumaria, além de suas propriedades medicinais como antibacteriano.

As actinobactérias isoladas revelaram ação antimicrobiana contra fungos e bactérias de interesse clínico e ambiental. De acordo com a pesquisadora, as bactérias do gênero Streptomyces cinereus se mostraram eficientes no combate à levedura Candida albicans e a espécies de Staphylococcus, frequentemente associadas a casos de infecção hospitalar. Elas também se mostraram ativas contra os fitógenos de interesse agronômico, Fusarium sp. e Rhizoctonia solani; e de interesse florestal, como o Postia placenta e o Polyporus sanguineus, que degradam a madeira. "Estamos na fase do isolamento e da purificação da molécula, para a descrição química do composto".

Os estudos já realizados também apontam para o registro de novas espécies de bactérias para a ciência. "Temos algumas linhagem de Streptomyces que estão em processo de identificação, por meio do DNA, para certificação de que se trata de novas espécies", afirma.

Enzimas - As actinobactérias encontradas próximas às raízes da macacaporanga também apresentaram potencial para produção de diferentes enzimas de interesse industrial. Uma das mais promissoras é a L-glutaminase, que apresenta ação antitumoral utilizada no tratamento de doenças graves, como a leucemia linfóide aguda (LLA).

Outras enzimas produzidas por essas bactérias são amplamente utilizadas pela indústria alimentícia, como as amilases,que atuam na hidrólise do amido; as pectinases, utilizadas na produção de vinhos e sucos; as proteases, que hidrolisam (quebram) as proteínas; e as lipases, que atuam na degradação de óleos, gorduras e outras moléculas lipídicas complexas, tendo aplicação na fabricação de detergentes de limpeza biodegradáveis e na remediação de solos impactados com óleos.

Entendendo a pesquisa – O estudo da produção de compostos bioativos por actinobactérias contempla várias etapas, que visam ao isolamento e à identificação das bactérias e da estrutura química das moléculas produzidas por esses micro-organismos. Da retirada de amostras de solo ou de outro substrato até a identificação química dos compostos bioativos há um longo caminho a ser percorrido pela ciência.

A primeira etapa da análise visa à caracterização morfológica e bioquímica dos micro-organismos presentes em amostras de solos, sedimentos de rios, partes de plantas, entre outros. "Tudo começa com uma amostra ambiental", afirma a pesquisadora.

A segunda etapa consiste na prospecção (verificação) dos prováveis metabólitos produzidos pelas actinobactérias. Um dos métodos utilizados é o da fermentação em meio líquido, realizada em biorreatores que induzem as bactérias a produzir substâncias antibióticas ou enzimas. Comprovada a produção, inicia-se o processo de separação para o isolamento dos metabólitos bioativos. "Utilizamos uma série de produtos químicos, como solventes, para resgatar e isolar esses metabólitos", explica Escher.

Na terceira etapa são realizadas a caracterização química dos metabólitos e a avaliação da sua menor concentração ativa. "Selecionamos uma série de micro-organismos, não só de interesse clínico, mas de interesse ambiental, para testar as atividades antimicrobianas e verificar o espectro de ação do bioativo".

Rede de Parcerias – A pesquisa conta com a participação de bolsistas de iniciação científica, mestrado e doutorado, além de parcerias com outras universidades públicas: Departamento de Biologia Celular e Molecular da USP/Piracicaba, através da professora Tsai Miu Sui, que colabora na identificação molecular das bactérias; Departamento de Antibióticos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPEDA), por meio das professoras Janete Magali Araújo e Gláucia Lima, para a identificação morfológica e molecular das linhagens de bactérias isoladas; Departamento de Ciências Farmacêuticas e Laboratório de Produtos Naturais da UFPE, por meio da professora Elba Lúcia Amorim, para a elucidação química dos metabólitos.

"Outra importante parceria é a do Grupo de Pesquisa de Bioativos da Ufopa, o qual contempla diversos pesquisadores das áreas de Farmacologia e Química de produtos naturais, o que tem possibilitado expandir o perfil metabólico dos bioativos produzidos com a experimentação de outras propriedades biológicas, assim como a elucidação química das substâncias ativas isoladas", explica a pesquisadora.


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