06/10/2023 às 15h31min - Atualizada em 06/10/2023 às 15h31min

Pior seca em rios da Amazônia provoca risco de colapso em abastecimento no país

Seca dificulta navegação pelos rios da região amazônica

Da Redação
Gazeta do Povo

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Seca dificulta navegação pelos rios da região amazônica.| Foto: Cadu Gomes/Vice-presidência da República

AMAZÔNIA - A pior seca já enfrentada pela região amazônica, na região Norte do Brasil, pode provocar efeitos devastadores, ambientais e econômicos, para todo o território nacional. O alerta vem de organizações civis e de entidades de diversos setores e segmentos. 

Com rios que operam como hidrovias, o escoamento de produtos está comprometido e com níveis d'água baixando, dia após dia. “Já não conseguimos mais chegar com produtos na Zona Franca para a produção e temos dificuldade para escoar o que estamos produzindo”, relatou o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam), Antônio Silva. 

O industrial considerou que o próximo grande impacto será a chegada de alimentos, comprometendo refeições diárias de centenas de milhares de pessoas. “Logo teremos problemas com abastecimento de alimentos. Algo precisa ser feito com urgência. O Estado deveria decretar estado de emergência e o governo federal liberar recursos para a dragagem do rio Madeira”, completou Silva, durante entrevista à Rádio CBN, ao reforçar que a estiagem diminuiu o nível do rio, formando bancos de areia e piorando a navegação. 

Seis a cada dez produtos que saem da Zona Franca de Manaus são escoados por rios. Entre eles estão eletrônicos, aparelhos de ar condicionado e televisores. O presidente da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), Jorge Nascimento, alertou que, em alguns casos, há registro de aumento no transporte de cerca de 50% e que os efeitos só não devem ser ainda piores de imediato porque as empresas enviaram produtos antecipados para a Black Friday, que neste ano será no dia 24 de novembro. Porém, reconheceu ele, se a seca se estender até o próximo mês pode haver risco de desabastecimento de produtos para o Natal e outras datas comemorativas. 

O diretor-executivo da Associação Brasileira de Armadores de Cabotagem (Abac), Luís Fernando Resano, considerou que mesmo que as empresas tenham feito estoques para o fim do ano, eles podem acabar rápido dependendo do volume aguardando comercialização. 

Seca no Norte, cheias e tornados no Sul 

De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (Inpa), somado ao El Niño, que provoca aumento das temperaturas em águas superficiais do oceano na região do Pacífico Equatorial, o aquecimento do Atlântico Tropical Norte, acima da linha do Equador, não permite a formação de nuvens, o que interfere na falta de chuvas na Amazônia. Enquanto isso, o Sul do país volta a enfrentar episódios de tempestades e cheias históricas. Desde o início do ano, o Rio Grande do Sul passa por ciclones extratropicais com traços de destruição e provocando mortes, também sob influência do El Niño. Nesta semana, um tornado da categoria F2 - em uma escala que vai até o F5 entre os mais perigosos – atingiu a região oeste do Paraná. 

Sem chuvas no Norte e agravamento da seca, os principais canais de navegação seguem travando na região. Fabricantes e empresas que operam no escoamento de produtos lembram que, além do rio Madeira, a situação se repete nos rios Negro e Solimões. “Não temos como transportar. Hoje estamos preocupados com o industrial de Manaus, mas do jeito que está acontecendo, se as autoridades não tomarem providências, teremos em breve problemas ainda mais sérios”, alertou o presidente da Fieam. 

Na entrevista à CBN, o empresário destacou que mercadorias que antes podiam ser entregues em até cinco dias estão levando de 20 a 25 dias para chegar ao destino. Isso vale para todos os insumos no modal de cabotagem. Nesta semana, o nível do rio Negro, em Manaus, chegou à sua 13ª pior vazão em 120 anos e a tendência é de piora. “A meteorologia revela que a seca vai continuar, só tende piorar”, completou. 

Valores pago a práticos saltou de R$ 80 mil para R$ 800 mil por navio 

Outro agravante que pode provocar aumento imediato nos preços é a chamada “taxa de seca” cobrada pelas empresas com profissionais conhecidos como práticos, que auxiliam na indicação de percurso e rota para que navios atraquem nas bacias. A Federação das Indústrias tem defendido medidas que possam regular o modal fluvial no período chamado de vazante. 

Em períodos de cheia, os práticos cobram, em média, R$ 80 mil por embarcação, de acordo com o órgão. Com o secamento do canal, os valores dispararam para R$ 800 mil por navio, tornando a operação quase inviável. Em documento enviado à Marinha, a Fieam destacou que é preciso "promover o equilíbrio econômico aos usuários das hidrovias, coibindo a prática de preços abusivos pelos atores do sistema". A Eletros reforçou que, por enquanto, os produtores têm absorvido esse aumento no preço dos transportes, condição que pode não se estender por muito tempo. 

Para o setor produtivo local, parte dos problemas estaria solucionada se a BR-319 - que liga Manaus a Porto Velho, depois Porto Velho a Cuiabá e a São Paulo - estivesse em melhores condições. A rodovia tem longos trechos com estrada de chão, dificultando o transporte e encarecendo o tráfego de caminhões. Com a dificuldade para navegação pelos rios e estradas sem asfalto, o que pode restar é o tráfego aéreo, mas as organizações alertam que o modal não vai dar conta da demanda e vai encarecer ainda mais a logística e, consequentemente, os produtos. 

Hidrelétrica inoperante e possibilidade de remoção de comunidades inteiras 

No curso do rio Madeira, a quarta maior usina hidrelétrica do país, a Santo Antônio, suspendeu as operações temporariamente por conta da seca extrema. O governo do estado do Amazonas estuda a possibilidade de remover comunidades que vivem da agricultura familiar em trechos de várzea. Em vários pontos do estado, moradores tentam transportar casas inteiras, com medo de serem destruídas ou sugadas por deslizamentos. 

A confiar na meteorologia, a esperança não deve vir do céu, sob o risco de prolongamento da estiagem até fevereiro de 2024. As cheias que eram esperadas a partir da segunda quinzena deste mês não devem se confirmar, segundo os principais institutos meteorológicos do país, como o Climatempo. 

Na última sexta-feira (29) ,o governador Wilson Lima (União Brasil) decretou situação de emergência ambiental por três meses e anunciou a criação do Comitê Intersetorial de Enfrentamento à Situação de Emergência Ambiental para ajuda humanitária às famílias. O estado criou o aplicativo Cota Rio, da Defesa Civil do Amazonas, para auxiliar no monitoramento contínuo dos níveis dos rios no estado, além de previsão do tempo e alertas emitidos pelo órgão. A ferramenta está disponível para sistema Android e opera de maneira offline. 

Nesta semana, uma comitiva formada por ministros de estado e pelo vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) visitou estados da região Norte atingidos pela seca. Alckmin, que também é ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, anunciou destinação de recursos para obras de dragagem, uma no rio Solimões e outra no rio Madeira. O objetivo é recuperar a capacidade de navegação. 

Segundo o governo federal, “a primeira obra terá oito quilômetros de extensão, com duração de 30 dias e custo de R$ 38 milhões e a segunda, de 12 quilômetros, terá duração de 45 dias e custo de R$ 100 milhões”. O governo estuda liberar o seguro-defeso aos pescadores pelo período em que foram prejudicados. 

Segundo o Ministério de Minas e Energia, uma ação preventiva permitiu estocagem de óleo diesel na região para fornecimento de energia, “o que garantirá, pelos próximos 30 dias, o sistema de abastecimento de 169 setores isolados no Amazonas”. 

Levantamento da Defesa Civil do Amazonas desta quinta-feira (5) indica que 40 municípios - do total de 62 - estavam em situação de emergência. No estado, a seca extrema afeta 200 mil pessoas (50 mil famílias). A estiagem também castiga estados como Rondônia e Acre e mais de 500 mil pessoas já foram afetadas.


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